Fantástica Gramática Automática
Tuesday, February 27, 2007
  Os teus pés dentro das sandálias
Lembrei-me de como o próximo Verão vai ser
(mais a sandálias dos atilhos que subiam pelas tuas canelas, que é delas?)
embora estivesse apenas a pensar em sol e praia. Lembrei-me do Verão pelas sandálias que nãotrazias calçadas
(nem sequer olhava para os teus pés porque não estás aqui.)
Gostava de te ver a calçar as sandálias, a evitar a fivela e a apertar o cabedal contra a barriga da perna
(o desequilíbrio do teu corpo a mala que escorregava braço abaixo o pé coxinho e invariavelmente caias em mim
não em ti
para não caíres no chão, para que ficasses de pé)
onde ficavam pequenos vergões que se dissipavam com o retomar da circulação. Cruzavam os atilhos à frente e atrás, contrastava o castanho cabedal com a alvura da tua pele
(“Detesto ser tão branca”
não me consigo lembrar porquê, mas até tu dizeres que não gostavas de ser tão branca eu nunca tinha pensado que gostava
ou não
das pessoas pela cor da pele. Achava-as bonitas ou feias ou o que quer que fosse não pela cor, mas pela forma do nariz, tamanha das orelhas e maçãs do rosto
mas as maçãs do rosto já falei e gostava tanto das tuas que não me importava delas brancas
ou vermelhas depois do sol. Gosto das imperfeições como algo irrepetível. Gosto de ti tão branca que não percebes. Como gostaria de ti tão de outra cor que também não irias perceber. Porque continuo a gostar das pessoas não pela cor da pele)
uma marca ainda mais branca e lá iam os atilhos perna acima coxa acima. Era só uma volta que davam, o pulo na dificuldade dos calcanhares e andavas quase no pé do chão
(o Pulo do Lobo virava Aquiles)
mas não era isso que me fascinava, era imaginar que os atilhos não paravam de subir, mesmo já escondidos na saia branca
(de flores verdes e vermelhas que levaste para o nosso primeiro encontro)
imaginava-os a subir em movimento circular sensual, já na coxa,
(descruzaste as pernas e levantaste-te da esplanada, nem atilhos nem pernas
barrigas e coxas
não reparaste que te movias sem pernas, que tinham ficado ali, fixas no meu olhar, que te tinha imobilizado e essa imagem lentamente desaparecia, se diluía com a subida do mercúrio, com o fumo do cigarro que tinhas preso entre o indicador e médio
foi que sopraste as tuas pernas dos meus olhos)
descem de repente os atilhos, até aos pés, ao Pulo de Aquiles, presos lá que não saem. Olhei para as tuas pernas, para os teus pés, nus sobre a cama o cheiro a verniz vermelho, umas botas abandonadas ao lado da cama e um par de meias que não sei onde
(por aí talvez.)
Não te pergunto pelas sandálias que nãotrazias mas vejo-te quase nua, dos tornozelos para baixo,
Já é Verão?
 
Thursday, February 22, 2007
  Ensaio parcial sobre a Honestidade Intelectual
Publicado em livro, mas escrito no balcão de um peep-show, ou assim nos fez crer que o escreveu, pelas palavras de Mondrian Kilroy. E vai assim,

POOMERANG: Se um assaltante de bancos vai parar à cadeia, porque é que os intelectuais andam à solta?
As ideias são como as galáxias de pequenas intuições, uma coisa confusa, que está sempre a modificar-se e é substancialmente inutilizável para efeitos práticos. São belas, nada mais, são belas. Mas são uma confusão dos diabos. As ideias, se estiverem no estado puro, são uma maravilhosa confusão. São aparições provisórias de infinito. As ideias «claras e distintas» são uma invenção de Descartes, são uma fraude, não existem ideias claras, as ideias são obscuras por definição, se se tiver uma ideia clara, é porque não é uma ideia.
Quando se exprime uma ideia dá-se-lhe uma ordem que ela na origem não possui. Seja como for, tem de se lhe dar uma forma coerente, e sintética, e compreensível para os outros. Enquanto nos limitamos a pensá-la, ela pode permanecer a maravilhosa confusão que é. Mas quando decidimos exprimi-la começamos a eliminar qualquer coisa, a resumir outra parte, a simplificar isto e cortar aquilo, a arrumar o todo dando-lhe uma certa lógica: trabalhamo-la um pouco, e no fim temos uma coisa que as pessoas podem compreender. Uma ideia «clara e distinta». Mas já não são ideia. São detritos de ideias organizados magistralmente até se tornarem objectos solidíssimos, mecanismos perfeitos, máquinas de guerra.

BARICCO, Alessandro (2000). City. Oeiras: Difel, 162-164.
 
Tuesday, February 20, 2007
  Os meus heróis tardios e velhinhos
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Wednesday, February 14, 2007
  Murais
Acho que acabou por começar durante o fim-de-semana, não um fim-de-semana qualquer, o passado, aquele em que por breves momentos voltei a ver uma cidade que eu desconheço e que me não conhece
(acabou como sempre, a ver o mundo pelo fundo de copos vazios, entornados e pingados e a barriga inchada no dia seguinte, demasiado cheia a arrotar gases,
da água tónica que misturava o gin
do dióxido de carbono da cerveja e já não sei que mais.)
embora tenha acabado por começar assim, entre copos e demasiados cigarros que no dia seguinte, o do referendo polémico
(e calo-me em relação à minha posição politica, uso o referendo com referência temporal e é esta mesma a única referência que vou fazer
ou bastava ter dito que tinha sido no fim-de-semana de dez e onze que só tinha começado no dia dez para mim, mas agora já não interessa porque já está escrito e não merece a pena apagar)
tinha uma voz que não reconhecia. Arranhada e com a mesma roupa da noite anterior
(dormir de sapatos e casaco)
tresandava a cheiros de bares cheios, a suor de pessoas que tinham demasiados casacos e demenos desodorizante. A mio de uma conversa alguém disse,
“Quando saía de casa em Berlim via no alto de um prédio
(alto devia ser o telhado, acho)
um telão de que dizia Bonjour Tristesse e sorria sempre que via aquilo”
(eu pensei que também, era bonito, e acho que se visse algo como isso escrito todos os dias também sorriria sozinho, numa manhã de sol a ouvir música, dentro de mim, entre o fígado e vesícula, na bacia nas costelas, por todo o corpo
não é por acaso que temos um osso chamado rádio)
estranhei a língua e pensei que seria mais indicado qualquer coisa como Guten Morgen Traurig
(é um grande risco confiar nas traduções da internet misturadas com a elementaridade do nosso alemão e arrisco-me a despertar a ira dos germanófilos e lusófobos.)
No Cabo Ruivo, em Lisboa, à saída da estação de metro, reparava nos grafittis por causa da conversa do fim-de-semana
(a do telão da tristeza)
e um dizia Amanhã Dou-te Os Parabéns e pareceu-me extremamente poético. O suficiente para um Bom Dia Tristeza em Lisboa
(mas ao fim da tarde
ou meio da tarde mas quase fim porque já é de noite a essa hora embora o dia já se encontre a aumentar desde vinte e um de Dezembro).
 
Friday, February 09, 2007
  As cartas
Foi por acaso e eram tantos baralhos que eu pensava que já não ia ser capaz de os distinguir
(e também nunca pensei que estivessem completos
ou pelo menos um deles, um só que desse para fazer aquilo que foi, aquilo em que acabou a noite, sem saber muito bem que já não era noite e era quase de manhã
quase sol
nas Olaias as olaias começavam a florir e as pessoas nas paragens do autocarro
e nós em casa
ainda
a separar baralhos para finalmente obter tantos montes desiguais
anjos
runas
Osho
e os outros que não conhecem mas eram conhecidos de quem conhece.)
Era já de manhã, então. A primeira mensagem foi para todos
(dos anjos e vão ser todas paráfrases que me já não recordo nem quero),
Vá a um lugar sagrada para si onde pratique ritual
- Mas eu não tenho lugares sagrados, não pratico rituais, eu sou o céptico deste conjunto
(não me vou rir porque é falta de respeito, mas não acredito e não quero acreditar porque não faz sentido, é tão bom como esoterismo da montanha
Tibete
Nepal
Himalaias
Dalai Lama e isso tudo)
- Tira três cartas e eu tirei.
Junte-se aos que ama
(o primeiro aperto na garganta, detesto quando estas coisas começam a fazer sentido e eu não tenho forças para a combater, sou tão mau argumentador que o meu cepticismo foi para a sanita)
Acalente os seus sonhos
(escrevo mas o meu grande projecto está parado, quero mais e mais e menos este aperto que me voltou à garganta, que me toldou os olhos como uma cólica lacrimosa)
Divirta-se
(neste momento só me saiu um esgar e todas as pessoas se conseguem divertir, eu não porque tenho sempre qualquer coisa com que me preocupar e não é que me importe, e o aperto na garganta foi tão grande, uma maçã de Adão caramelizada entre as vias respiratórias e alimentares, parada e estática e eu com vontade de fugir
e era só para os teus braços, como a nossa canção do aeroporto e aguentei-me.)
a última carta não foi escolhida nem foi para todos, foi tirada para mim e para mim só
Encontre um ritual ou um lugar especial
(silêncio
silêncio
silêncio
e três vezes o silêncio quais ir para casa)
e foi quando o sol floria olaias nas Olaias.
 
Tuesday, February 06, 2007
  Alimentação da alma e espírito
Há uma anedota de canibais que envolve maçãs do rosto(uma alimentação equilibrada e com muitos vegetais
porque tinha um seguimento brejeiro e metia arbustos à mistura que simbo
não interessa, nem tudo necessita ser explicado)
e uma refeição feita do corpo de uma pessoa. Mas lembrei-me desta anedota quando descobri que gosto de maçãs do rosto salientes. Acho as mulheres mais bonitas
(mas nunca teria conscientemente reparado neste pormenor se me não tivessem dito que tinham uma fascinação
pulsão
cathexis
por mulheres de narizes compridos e assim reparei nas maçãs do rosto.)
Era uma mulher que estava a acender um cigarro num bar barulhento entre o rio e o elevador da Bica
(da casa da Maria)
e a mulher que acendeu o cigarro tinha umas maçãs do rosto tão grandes que podiam ser maçãs verdadeiras, verdes ainda porque ela era nova
(e viçosa mas não sei mesmo se era verde como as maçãs que eu imaginava no rosto. Hoje o Cesário é um poeta forte em mim, mas não me sinto angustiado. Sinto-o ao meu lado como um fantasma, mas que não me oprime, que me liberta
porque quanto mais dele me aproximo
mais dele me afasto.)
mas não sei se era bonita, porque só as maçãs me fascinavam. E o cigarro que acendeu com fósforos e o apagou com um movimento de antebraço seco. Fui buscar todas as fotografias que tinha tuas e fui confirmar as tuas maçãs
(foi encontrar naquele pomar um manancial de sensações
os teus sinais
os teus poros
o cheiro das tuas maçãs
a seiva que corre dentro de ti depois do
.)
E aquilo que me tinham confidenciado sobre narizes eu transformei em maçãs para mim
(e naturalmente me lembrei de uma anedota de canibais que comiam maçãs do rosto e arbustos que simbol
não interessa porque é melhor a sugestão que a explicação e quem não compreendeu da primeira vez não vai compreender agora só porque acrescentei mais uma letra à palavra que deixei a meio)
não porque achei uma imagem poética bonita mas porque realmente gosto de maçãs do rosto salientes.
 
Sunday, February 04, 2007
  Ainda larva
Quando tudo começou eu não era sólido, era pesado
(nunca me lembraria de dizer isto, mas uma vez que vi uma curta metragem, em que a maioria dos actores eram muito maus, até a Maria do Carmo que eu conhecia e que no final se saiu com uma frase em que dizia para um professor de física e química que tinha ido ver um peep show em que uma outra fulana mostrava as mamas
- Parecias tão sólido, afinal és apenas pesado.
E ele não responde nada e vai dar aulas para o liceu Camões a uns alunos cujo expoente máximo de indisciplina é conversar virados para trás
e termina assim, com ele de costas e ela a fazer dança jazz)
e há uns dias atrás voltei a ouvir uma metáfora lindíssima. Ainda é larva, mas vai ser a borboleta mais linda.
 
fgautomatica@gmail.com | 'é necessário ter o espírito aberto, mas não tão aberto que o cérebro caia'
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