Fantástica Gramática Automática
Monday, May 28, 2007
  Assim
Assim. Especialmente quando
(assim)
está sol, especialmente quando
(assim)
há algo bonito que me faz acreditar. Não acredito de forma alguma, nem
(assim). Se ao menos estivesse a ficar religioso, mas não. Um cepticismo incoerente e sem fundamentos
(assim)
como as minhas opiniões porque sim
(assim)
de qualquer maneira. Acabei por justificar tudo e cada detalhe pormenorizado que até desenvolvi uma explicação para dizer que o branco é a minha cor preferida e porque é que de manhã prefiro ouvir The Beatles e à noite The Magnetic Fields. Porque, porque porque. Porque no último ano foi a palavra que mais proferi
(assim)
sem mais nem menos, porque sim. Para que acreditassem em mim
(assim.)
Assim
(outra vez.)
Contemplar o céu como algo que vela por nós, contemplar só, ser profundamente metafísico
(assim)
com os sentido autizados para me concentrar só no céu, cinzento de país sem sol. O céu cai tanto
(assim)
como o dia de hoje, fechado em casa, o mundo lá fora acontecer, a bomba a atómica, os testes coreanos, o ministro suicida, o centro de saúde de Vendas Novas, os massacres no continente quente, Paris presa, Victoria nos Anjos e tudo mais
(como o dia de hoje, fora o almoço, o polvo, a água do Luso, a baba de camelo e a conta em libras em vez de euros.)
Olhar para o cima no dia de céu incerto, conspiram tanto nas minhas costas que me deixei de importar. Só o céu; talvez esteja a ficar relig
(outra vez)
(assim não!)
É continuar até à biblioteca, empurrar o carrinho, decidir cotas e arrumar os livros que outros desarrumaram. O olhar de espanto, aquele olhar vazio pelo cano, dois olhares
(assim.)
Mas não acabo morto
(ainda assim agora.)
A não ser daqui a uns anos. Décadas, de preferência.
 
Thursday, May 24, 2007
  Erro de conduta...
… é pedir uma opinião a Platão ou a Hegel.
 
Monday, May 21, 2007
  Dias ao sol
Foi bonita a festa, pá
Pena ter terminado tão depressa. Tinha fumado mais um cigarro, bebido mais um copo de vinho. Aquela moça que passava e bamboleava a bunda boa, piscava-lhe o olho, beliscava-lhe a pele e ficávamos a ver ao astro mudar no horizonte.
Fiquei contente
O vinho fez-se hálito mau no dia seguinte a bunda saía da cama ao olhar este farrapo de pessoa, os de cão-abandonado-carneiro-mal-morto, Não te quero homem, não quero ser mãe e saiu porta fora. Eu fiquei, olhei para o vinho em mim e para os despojos da noite.
Ainda guardo renitente um velho cravo para mim
Na lapela do casaco, na ponta da espingarda, abandonados à cadeira, ao chão, na ânsia de a despir, de lhe arrancar a roupa e agarrar a pele da bunda.
Já murcharam tua festa, pá
Não foi só a festa. Foi o apêndice também, depois da bunda. Sai a dizer que não quer se mãe e eu dobro-me em mim nos lençóis com cólicas de morte da noite que passou, de dia livre que virou festa de flores.
Mas certamente
que sim! Ela não é mãe e eu queria ser filho. Queria ser amamentado, rebaixado e tratado, escravizado, adulado, idolatrado, lavado. Um reizinho de caracóis loiros e olhos azuis, roscas gordas nas pernas e um terno de ir à igreja.
Esqueceram uma semente nalgum canto do jardim
Não há sementes esquecidas, foram todas deitadas fora. Em borrachinhas, todas as que gastámos durante a noite, a única mesmo, que não foi permitida mais nenhuma, que saíste porta fora, sem ai nem ui, como mãe rafeira que abandona um cachorro.
Sei que há léguas a nos separar
Tanto mar, tanto mar
Sei, também, quanto é preciso, pá
Navegar, navegar
Canta Primavera, pá
Cá estou carente
Manda novamente algum cheirinho de alecrim
Até aos santos do próximo ano, amigo Chico.
 
Thursday, May 17, 2007
  Anúncio de um banco
Aqui podia ser feliz. Até podia ser feliz em qualquer lugar
(até na cantina onde almoço, onde bebo chá e como bolachas de chocoloate ao lanche, onde leio Platão e já li outras coisas numa língua incompreensível para quem quer que não seja português
ou talvez seja compreensível pela capa dura e o ar sério
e azulado e cinzento, turquesa escuro
da capa)
. estava sentado na cantina com os pés em cima do sofá, com as calças pretas ficar cinzentas do uso, os sapatos que cheiram mal quando não têm pés lá dentro. Rabiscava palavras chave
(determinação
relação)
do livro quatro sobre um prato de cenoura e alface e um tupperware de massa-sem-fim e truta fumada e um pouco de maionese. Escrevia notas sobre educação e pouco sobre a minha tese num bloco de notas que trouxe da biblioteca
(as folhas caem, e isso é uma imagem poética tão gasta quanto os poetas que a utilizaram para simbolizar a morte
a mudança de fase
estação. Mas são tão bonitas as folhas brancas cheias de azul e preto
a minha letra está a mudar
espalhadas no chão alcatifado. Sempre gostei mais de alcatifas, não fazem barulho e os pés tornam-se mais leves
a minha avó tinha um corredor de dez metros todo alcatifado. É mais acolhedor, dá vontade de tirar os sapatos.
O burburinho das pessoas servia de plataforma à música, como se inverteram os papéis. As pessoas o pano de fundo e a paixão segundo São Mateus a degladiar-se com a República.)

Aqui podia ser feliz. Mas porquê? Porque não em Lisboa, Bremen, Berlim? Porque a transitoriedade está em relação com o tempo que lá passamos. Aqui podia ser feliz, como em Lisboa, Bremen, Berlim, Auckland
(kiwi!)
, medimos a felicidade em relação com aquilo que já fomos e somos porque
(à partida)
devemos estar melhor daquilo que já estivemos. Ou somos mais infelizes em relação com a felicidade que já sentimos. Acho que aqui não podia ser feliz. Porque aqui sou feliz. A conjugação do verbo é que está mal
(não, o verbo está mesmo a mais)
.
 
Monday, May 14, 2007
  Mistérios da Fé
 
Wednesday, May 09, 2007
  As mulheres
As mulheres gordas queixam-se porque hoje em dia só há roupa pequena que não lhes serve, por causa da Kate Moss e da Topshop.
As mulheres magras queixam-se porque hoje em dia só há roupa grande que não lhes serve, por causa da Kate Moss e das doenças de comportamento alimentar.
Eu queixo-me porque, apesar de todos estes dilemas, as mulheres continuam a andar vestidas.
 
Monday, May 07, 2007
  Paráfrase fílmica
Como nunca tinha chupado os mamilos a ninguém, nem as mamas nem nada, não quis porque não sabia como se fazia. Não é que não gostasse de ti nem de te chupar as mamas e os mamilos, mas como já deves ter tido muitos rapazes que te chuparam as mamas e os mamilos, não queria fazer figura de parvo. É que gosto de ti.
Não foram assim tantos.

Queres namorar comigo?

 
Thursday, May 03, 2007
  Exercício de memória: sobre a minha terra
Dei-me conta que para ser um bom cronista tinha que escrever essencialmente sobre coisas que me aconteceram
(porque da minha vida vou sabendo melhor do que as outras coisas todas)
, de preferência num passado distante. A minha primeira bicicleta, a rua onde morei, os testes de latim
(no meu caso a angústia derivava para o francês
a minha tendência é anglística)
o cheiro a incenso de casa da minha avó
(mentira, da igreja
mas qual igreja que os meus pais não eram religiosos por aí além)
o largo da minha outra avó, os passeios de Domingo com o Domingos
(mas não tenho uma passado que seja assim tão passado a que me possa referir. Dá vontade de dizer,
“Não nasci em Benfica”
“Não nasci no bairro da Sé”
. O meu passado é tão recente. Parece que o meu passado carece de história. É apenas um laivo coevo e contemporâneo, que se encontra no limiar do interessante e do piroso. Como a música dos anos oitenta, que um dia há-de ser história porque existiu. Como qualquer ser humano.)
Nasci em Portalegre, uma cidade que passou a livro por causa da morte
(ainda hoje ao jantar contava uma dessas histórias, o gajo que estava tão cheio de tudo que transbordou para fora do seu próprio corpo e de um parapeito de cinco metros. Talvez não seja muito alto, mas quando estamos a dormir e não damos conta, até dois metros são um sarilho; mas se estivermos cheios de tudo e transbordar também e estivermos a dormir no parapeito
de cinco metros, já disse?
Partiu qualquer coisa e morreu. Esta história também vem no livro.)
Agora sim, precisei do tempo:
Lembro-me de do calor do Verão, de como a explanada se torna tão vermelha
não são as luzes
nem os carros
nem os vestidos
os pés descalços e as sandálias
é o calor que penetra o amarelo da cerveja)
uma cidade inteira sobre o efeito de LSD. Uma praça tão cheia de calor que as pessoas derretem nas cadeiras e nas mesas como os relógios do Dalí
(não é só o calor, é também a inércia e o incessante esfumar das chaminés. O barulho, os fogos de Verão. A dificuldade em respirar.)
 
fgautomatica@gmail.com | 'é necessário ter o espírito aberto, mas não tão aberto que o cérebro caia'
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