Fantástica Gramática Automática
Sunday, January 08, 2006
  Metafísica da Vida
Corremos. O ar estava frio e nós corríamos. À nossa frente corriam algumas pessoas com a mesma intenção; corríamos todos. O ar estava frio e eu estava com calor porque corria, porque exigia ao corpo um esforço suplementar para depois poder descansar.
Chegámos à paragem do eléctrico e eu suava, nasciam pequenas gotas na minha testa que o ar frio insistia em cristalizar. E depois de vermos tantas pessoas correr à nossa frente, depois de fazermos nascer o suor nas nossas testas, decidimos com um sorriso que iríamos subir ao castelo a pé. E subimos e mais suor nasceu e cristalizou nas nossas testas. Porque já andamos fartos de transportes e andar a pé é bom e mesmo que chegássemos cansados, a busca daquilo que procurávamos sempre era melhor se fosse com esforço, porque maior seria a recompensa quando conseguíssemos entrar, quando aos nossos pés a cidade se deitasse – tamanha é a arrogância desta afirmação, mas por outro lado, eu também sou arrogante!

Sim, a cidade caiu aos nossos pés. O outro lado do rio mostrava-me o pórtico da Lisnave, aquele pórtico vermelho que a aprendi a descortinar da varanda do Adamastor há uns Verões atrás, onde aprendi a olhar o rio e vi as conversas a nascerem nos nosso lábios, desceram por entre quintais, ruas e vielas até ao rio, onde desembocavam a nadavam.
Mas era mesmo o pórtico que eu via. E não era do pórtico que eu queria falar; mas aquele monólito metálico captava a minha atenção da mesma forma que o miúdo espanhol que cuspia para o chão, para uns quintais nos baixos das muralhas do castelo: não resisti e enviei-lhe um olhar duro. Parou, avaliou-me; decidiu que era melhor não repetir a graça. Não porque eu o tivesse repreendido com o olhar, não por sido eu, mas justamente por não ter sido só eu. E a cidade tinha caído aos nossos pés e o pórtico da Lisnave mantinha-se intacto, como nas noites da varanda do Adamastor, com um copo de cerveja na mão e um cigarro noutra.
Lembro-me de há dias me terem dito que eu escrevia sobre a metafísica da vida. Não confessei que não sabia muito bem o que queria dizer metafísica, mas achei que aquilo me tinha sido dito num contexto elogioso, ou que pelo menos a minha escrita abarcava qualquer coisa de importante que valia a pena uma palavra que eu não sabia muito bem o que queria dizer. Não interessa, porque na verdade, só agora é que as cristalizações de suor da minha testa começavam a secar e a desaparecer eu não pensava em metafísica. Mas eu não escrevia sobre a metafísica da vida, escrevia sobre aquilo que via, a vida dos outros, aquilo que me acelera o coração até à exaustão e aquilo que mo faz abrandar até quase parar. Se calhar isso é a metafísica.

MAS EU ESTAVA NO CASTELO A VER O PÓRTICO DA LISNAVE! E O RIO E TUDO MAIS QUE HAVIA PARA VER!

E não há nada de metafísico nisto. Gosto do sol da tarde e de ver o rio.
[A interrogação metafísica deve desenvolver-se na totalidade e na situação fundamental da existência que interroga.] Só no caso de alguém estar com dúvidas.
 
Comments:
Meta Fisica da vida:

O ar estava frio e nós corríamos

Curioso, desmontar plavras....
 
Cada um com a sua sina; tu com a metafísica que querem por força que te acompanhe a escrita. Eu com a física quântica de que faço uso particularmente no que se refere às rimas. É uma fórmula extremamente simples; adquiri-a numa daquelas antigas drogarias na Morais Soares e que ainda existem...

Subir ao Castelo a penantes não é para qualquer um, embora dependendo do sítio de partida. Se fôr do Miradouro de Santa Luzia, até eu que tenho uma perna de pau...
 
hihihihiiiiiiiihihihiihihihihi...
hihihihihihihihihihihiiiii... cof cof..
com mil sapos...ainda não me habituei a esta gargalhada...

:)
 
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