Fantástica Gramática Automática
Monday, January 16, 2006
  Território Neutro, o Branco
No meio de uma estrada muito movimentada há um risco branco.
De relance, olho. Três raparigas, no mesmo momento, no mesmo preciso momento, infinitésimo de segundo e muitas mais fracções de segundo e de tempo, puxam uma baforada do cigarro, individual, que cada uma delas fuma. E nesse momento que congelei e que à luz da lentidão estou a descongelar, vejo que todas elas expeliram o fumo na mesma altura, no mesmo momento, no mesmo preciso momento, com todas as divisões e fracções miniaturas de tempo possíveis pela descrição descongelada do momento.
Faziam equilibrismo no meio de uma estrada com um risco branco, elas equilibravam-se em cima do risco branco. E o vento dos carros ou as equilibrava ou as desequilibrava. Mas elas permaneciam no meio, cada uma com seu cigarro imunes a tudo, como se a o risco branco em que se encontravam lhes servisse de protecção da violência que à volta delas acontecia, da velocidade da fúria e da raiva. E elas fumavam.

A rapariga da direita tinha o cabelo branco e era nova. A rapariga do meio tinha as unhas brancas e era nova. A rapariga da esquerda tinha um casaco de malha, branco, e um cachecol transparente que a noite não me deixou ver.
E todas tinhas um cigarro comprido, entre os dedos indicador e médio, que fumavam cadenciadamente, um cigarro branco e comprido que quase chegava ao chão. Esperavam para atravessar a estrada e expeliam baforadas de fumo., num equilíbrio em cima da linha, num coito de crianças que jogam à apanhada, num coito de carros que se atravessam à sua frente e atrás violentamente, furiosamente, com desejos escondidos de as esmagar. Mas em cima da linha branca – ao longo da qual caminharam já – estão seguras. E fumam os seus cigarros compridos.

O tempo que congelei, descongelou. E continuei o meu caminho, rápido como ia, sem conseguir olhar para trás, sem conseguir saber o que aconteceu à rapariga da direita que tinha o cabelo comprido e era nova, à rapariga do meio que tinha as unhas brancas e era nova e às rapariga da esquerda que tinha vestido um casaco de malha, branco, e um cachecol transparente que a noite não me deixou ver.

A tarde transformou-se em noite e as mulheres brancas ficaram na linha branca, no seu coito, no seu lugar seguro, à espera que os cigarros terminassem e que os carros passassem, para poderem passar. A da esquerda, a do meio e a da direita. Todas novas e todas brancas, de branco. Porque eram uma unidade tripartida e um triângulo unitário. E eram três e eram uma.
E expeliram o fumo ao mesmo tempo. Dos cigarros compridos, brancos. Com uma incandescência azul.
 
Comments:
Equilíbrio, desequilíbrio.... Equilíbrio, desequilíbrio....
Sem tirar um pé sequer da linha branca.
 
No meio de uma rapariga muito movimentada há um risco branco.
De relance, olho. Três vidas,...... um dia conto-te esta historia.

Também eu estou no meu coito, lamentavélmente, a congelar e a descongelar tempo....
 
Branco. Quantas vezes desejamos que tudo fique branco à nossa volta? Branco de neve, branco de pureza, branco de limpo, ou simplesmente branco do nada.Quando tudo está em branco, podemos sempre recomeçar!
Belo blog!
 
O teu coração não parou, seu mentiroso!, bate e bate bem. Vim aqui parar vinda de acolá, de ali. Li o que tão bem escreves e não resisti a ir à arca! Temi ficar por lá, no meio da tua escrita, sem retorno, tão bem que se estava!
Obrigada!
 
fiquei confundida com o "coito das crianças que jogam à bola" ficar confundida será bom?
 
afinal jogavam à apanhada e não à bola será isto determinante p a minha confusão?
 
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