O papá e a mamã bem queriam engenheiros, gestores e médicos. Se havia coisa que os filhotes tinham era criatividade. Em proporções e com expressões diferentes, mas a verdade é que o papá e a mamã achavam tudo uma gracinha, desde que não passasse de uma brincadeira. Sabiam que se passasse da brincadeira íamos ter sérios problemas.
Passou da brincadeira e ninguém teve sérios problemas, gostamos todos muito uns dos outros e até somos felizes.
A história começa quando fui almoçar com uma amiga minha que me tinha pedido para lhe dar um parecer sobre um conto que tinha escrito. Eu disse-lhe que daria a opinião a título pessoal, mas nunca académico, que não sei fazer coisas dessas. Entre as várias coisas que disse, notei que havia uma enorme proliferação do verbo amar. Gosto muito do conceito e amor e uso-o muitas vezes, mas detesto o verbo amar em todas as suas conjugações. Disse-lhe isto, mas ressalvei que isso era uma questão muito pessoal, que nada tinha a ver com o conto.
Horas mais tarde contei à minha irmã. Ela sorriu e disse qualquer coisa. Depois escreveu,
Como fazer um texto que agrade ao meu irmão abusando do verbo amar
A caneta e o teclado amam o meu irmão.
Os críticos literários estão completamente rendidos a esse tipo.
Os críticos amam o meu irmão,
Os editores amam o meu irmão.
O Lobo Antunes ama o meu irmão.
E o contador de visitas do blog ama o meu irmão.
E porque o dinheiro não trás felicidade mas ajuda muito
O euromilhões e o totoloto amam o meu irmão.
Um jaguar entregou-se-lhe com a chave na ignição
Porque ama o meu irmão.
E veio também um avião, já com piloto na cabine.
Disse: não te amar é um crime.
Onde queres ir? Toca a subir!
O amor ama o meu irmão porque S. o ama.
E se calhar é para sempre, o que conta muito.
Nunca é certo, mas amam-se na mesma.
Amam-se com toda a audácia.
E se o meu irmão é amada pela incerteza.
Também o é pela certeza.
Por todos, enfim,
E também por mim.