Vi-te há dias, Rui!
Vi-te há dias, Rui! Na livraria à procura do teu livro que não estava em nenhum destaque, nem expositor nem nada. Ninguém quis ouvir o que o Lobo Antunes disse sobre ti. Estavas sozinho e reconheci-te.
Ontem falei contigo Rui. Não me importava pá, o que estava a fazer. Compreendo o teu desatino, é uma chatice quando não nos reconhecem o trabalho. Voltavas a andar perdido pela livraria. Mas eu percebo porque conheço Rui; sei como é quando o fumo da fábrica está virado para a cidade e vai chover dentro de algumas horas. Sei como é essa ansiedade, uma tristeza e dolência que se apodera das pessoas e as cola no tempo. Avançam diacronicamente mas morrem sincronicamente. É assim a cidade do coveiro que se envenena e se junta aos tantos que enterrou. E da carolina que levou tantas facadas, mesmo ao lado da casa onde eu vivia, quando tinha cinco anos. É verdade Rui, ainda me lembro dessa merda.
Mas é triste quando fazemos o que tu fizeste. Não te levo a mal, mas fico triste. Pensei que fosses um gajo mais seguro, que te estivesses a cagar para essas intrigas de alcova. É tramada a insegurança e a dor de corno. Mas se te consola, eu ficava na mesma.
Um abraço,
Há vários dias que andava com isto dentro da minha cabeça. Numa livraria vemos imensas coisas, a maioria das quais preferíamos não ver. Esta foi uma das que se passou, com um escritor da minha terra natal, aquela das chaminés altas da fábrica de fazer rolhas. Da que está pronta a fechar.
Sou capaz, daqui a umas horas, de querer apagar e querer modificar. Talvez o faça ou talvez não. Mas para já Rui, dedico-te isto. Noutra altura talvez o trabalhe melhor e desenvolva. Porque mereces.