Sou tu amanhã
Já viajei hoje
(autocarro metro comboio avião e em breve o teu carro
e fiz mais quilómetros que muitas pessoas fazem em sete meses)
e só me apetece cair nos teus braços porque sei que tens força para me amparares e sei que vais estar no aeroporto e vais trautear o into my arms e me disseste ao telefone antes de voar,
- Já nem me lembro como se beija tanto tempo faz que o não faço
(eu também não e se calhar treinaste ao espelho como em miúdo
e depois lembro-me que a tua casa não tem espelhos e sempre que seco o cabelo tem que ser no reflexo do vidro da janela do teu quarto enquanto me cobiças em roupa interior.)
Viajei tanto e vivi tanto e tão demasiado nos últimos dois anos sinto-me tão cansada e por isso me apetece tanto o teu abraço
(um dois três quatro cinco seis sete oito nove dez onze e
não são contáveis os abraços mas a possibilidade de os ter.)
Puxo a mala pela pega
(não certa que partiste a certa
pesada que estava com roupa que disseste que eu não ia usar e não usei)
e não te encontro andas a ficar atrasado como eu fui. Não, não é de ti estares atrasado, o mais certo é estares a olhar para alguém sobre quem irás escrever mais tarde
(a mulher das limpezas tem um ar triste, limpa merda o dia todo
as pessoas fumam tanto, o que eu não dava por um cigarro
as crianças impacientam-se, que familiares vão ver
há cheiros para cada raça
nativo, tenho que ter cuidado por causa do pós-colonialismo
que manancial de possibilidades, perdia-me aqui e sem dar conta já desmarquei o livro mas como vou no início não faz mal
mas será que ela demora muito)
e nem te dás conta que eu já te olho a conversar contigo e com o livro de capa vermelha que lês
(o que lês?)
eu é que te abordo, prostro-me à tua frente e só porque a nuvem descobriu o sol e tu não o sentiste directo é que deste conta que alguém estava há alguns segundos
(longos segundos
largos segundos)
a observar-te, a olhar-te directamente como se fosse eu a esperar e tu a chegar desse mundo tão fácil e tão impenetrável que é o teu.
Abraças-me com tanta força e saudades que não és tu quem precisa de protecção sou eu pequena e frágil e estás tão magro que se vão ver os teus ossos quando estivermos nus daqui a nada quase.
“Este livro é mesmo bom e sabes que há muito poucas traduções de Ovídio e é incrível, tens que ler tens que ler”
(e mais e mais e mais e mais)
disparaste na tua ecolalia e quando entramos no carro
nem sei qual porque tu não sabes qual
(preto cinzento azul)
calo-te com os lábios e já as tuas mãos estão no meu corpo, já me mapeias por cima da camisola de lã, a mão desliza entre a saia entre as pernas e
- Vamos embora.