Fantástica Gramática Automática
Wednesday, January 24, 2007
  Quem por nós chorou
Foi a vizinha do terceiro direito
(porque nós morávamos no terceiro esquerdo e estávamos a mudar de casa e eu já não sabia onde estava a minha vida
caixotes
caixas
dossiers
malas
embrulhos não presentes)
que nos perguntou se íamos embora. Não gosto de conversas de vizinhas, querem saber sempre mais, demais
(mais, sempre pensei que não seríamos bem-vindos no prédio porque chegávamos tarde e ouvíamos música durante a noite toda
ainda que fosse muito baixinho),
- Vão sair
- Sim
(porquê?)
- Ah e não vai ficar mais ninguém?
- Não
(já deves estar toda feliz, vamo-nos embora, acaba o barulho à noites, as saídas para o aeroporto às quatro da manhã, as chegadas do Bairro Alto a horas que nem sei nem eles também)
- Está bem, não leve a mal por perguntar
- Sim, sim, boa tarde
(abre a porta do elevador, caixotes
caixas
dossiers
malas
embrulhos não presentes tudo lá para dentro e desce até ao piso térreo, dentro do carro, um suspiro pai e vamos para a casa nova e já nem sequer se fala nem pensa mais na conversa do segundo direito, que mania esta de se meter na vida dos outros.)
E na entrada do prédio novo a porteira
(cão, cadela rafeira)
cheirava aquilo que tinha trazido
(caixotes
caixas
dossiers
malas
embrulhos não presentes)
e a conversa repetia-se. E depois a vizinha do primeiro frente que agora estou no primeiro esquerdo. Era e fez-se depois de noite e estávamos cansados a jantar e o vinho pingou para a camisola e goela abaixo os músculos já doíam e a meio da noite acordei com cãibras.
A Maria contou-me,
Estávamos a carregar o meu armário e a vizinha assoma-se à porta e pergunta se vamos embora
(- Que chata)
não me interrompas e desata a chorar porque é viúva e tem medo de ficar sozinha e ouvir-nos entrar, mesmo às tantas e quantas horas da manhã era uma companhia. Chorou e eu tive tanta pena dela, porque mesmo sem nos conhecermos éramos uma companhia, alguém cuja vida sentido fazia para a dela.
Disseram-me uma vez que cada decisão na nossa vida influencia, pelo menos, a vida de mais quinze pessoas. Influenciámos apenas a de uma. Talvez haja quem mais influência tenha sobre os outros do que eu, nós. Mas fiquei com pena de não ter memorizado o rosto, o semblante, porque quando quis desabafar comigo e carregava para o elevador todas aquelas coisas que empacotavam a minha vida, era apenas um retalho físico, na altura
(sem desculpa sequer.)
 
Comments:
É impressão minha ou 'tás a imitar o ALA?
 
tudo influência, sempre. e até que pode não ser mau de todo.

é uma curiosidade muito engraçada essa.
 
há pessoas que nunca mais voltamos a ver. eu acredito que antes de morrer-a-sério há um banquete com todas elas.
 
gnoveva....não te ofendas....mas não pude deixar de rir quando li o teu comentário e imaginei o que disseste....
se quiseres fazer um banquete com todos os que conheces e conheceste fá-lo em vida....não esperes para quando estiveres "quase morta"....ihihih
rantamplan
 
Nunca pensamos que as nossas pequenas rotinas poderão ter algum efeito naqueles que (não) nos rodeiam...
 
Post a Comment

Subscribe to Post Comments [Atom]





<< Home
fgautomatica@gmail.com | 'é necessário ter o espírito aberto, mas não tão aberto que o cérebro caia'
2H 31 da Armada A Natureza do Mal A Origem das Espécies A Senhora Sócrates A Terceira Noite A Vida Breve Abrupto Albergue dos Danados Auto-Retrato Avatares de um Desejo B-Site Baghdad Burning BibliOdyssey Blogue Atlântico Borboletas na Barriga Chanatas Ciberescritas Cinco Dias CORPO VISÍVEL Corta-Fitas Da Literatura De Rerum Natura Devaneios Diário Divulgando Banda Desenhada Dualidade Ondulatória Corpuscular E Deus Criou A Mulher Estado Civil Estranho Amor French Kissin' Golpe de Estado Hipatia Ilustrações, Desenhos e Outras Coisas Insónia Irmão Lúcia Jardins de Vento JP Coutinho Kitschnet Kontratempos Maiúsculas Mas Certamente que Sim! Menina Limão Miniscente Mise en Abyme Miss Pearls O Cachimbo de Magritte O Insurgente O Mundo Perfeito O Regabofe Os Canhões de Navarone Pelas Alminhas Porosidade Etérea Portugal dos Pequeninos PostSecret Quatro Caminhos She Hangs Brightly Sorumbático Ter enos Vag s Terra de Ninguém Voz do Deserto Welcome to Elsinore Womenage a Trois
Blogtailors Cooperativa Literária Escritas Mutantes Exploding Dog Extratexto Mattias Inks Minguante mt design O Binóculo Russell's Teapot
A Causa Foi Modificada A Sexta Coluna Por Vocación Terapia Metatísica Tristes Tópicos
11/2005 - 12/2005 / 12/2005 - 01/2006 / 01/2006 - 02/2006 / 02/2006 - 03/2006 / 03/2006 - 04/2006 / 04/2006 - 05/2006 / 05/2006 - 06/2006 / 06/2006 - 07/2006 / 07/2006 - 08/2006 / 08/2006 - 09/2006 / 09/2006 - 10/2006 / 10/2006 - 11/2006 / 11/2006 - 12/2006 / 12/2006 - 01/2007 / 01/2007 - 02/2007 / 02/2007 - 03/2007 / 03/2007 - 04/2007 / 04/2007 - 05/2007 / 05/2007 - 06/2007 / 06/2007 - 07/2007 / 07/2007 - 08/2007 / 08/2007 - 09/2007 / 09/2007 - 10/2007 / 10/2007 - 11/2007 / 11/2007 - 12/2007 / 12/2007 - 01/2008 / 01/2008 - 02/2008 / 02/2008 - 03/2008 / 03/2008 - 04/2008 / 04/2008 - 05/2008 / 05/2008 - 06/2008 / 06/2008 - 07/2008 / 07/2008 - 08/2008 / 08/2008 - 09/2008 / 09/2008 - 10/2008 / 10/2008 - 11/2008 / 11/2008 - 12/2008 / 01/2009 - 02/2009 /