De bicicleta até Surrey
O gajo é meu amigo, de certeza. Antes de me sentar não sabia muito bem se merecia um documento Word, uma publicação, uma auto-edição no meu blogue; mas o simples acto de escrever
(e carregar nas teclas é físico mas o que pretendo escrever é metafísico, porque é digital e ninguém vai poder agarrar as letras
talvez copy paste cut se interessar)
é-lhe devido. O gajo é mesmo meu amigo. Tinha uma história complicada com o Surrey, uma mulher, uma nanny e um ou mais filhos que estavam com a nanny, uma bike
(que não compreendi se era bicicleta ou motorizada
ciclomotor,
não sei porque não espreitei à janela quando ia embora.)
A história começa com uma caldeira, um aquecimento central, uma campainha, os fios do telefone cortados
(o gajo
que acabará por ser mesmo meu amigo
tinha que ir de bicicleta até um sítio, apanhar o carro e a mulher
portanto não era uma a mulher mas sim a mulher
que se via bem pelo cachucho no anelar esquerdo
e depois guiar quarenta milhas até ao Surrey que és nos arredores, mas não sei bem onde é, há-de ser perto, de acordo com algumas medidas de grandeza, mas para uma ilha assim não tenho tanta a certeza)
e o gajo que vem arranjar isso tudo que chega às quatro e vinte mas que não trabalha depois das cinco, porque tem que ir apanhar o carro, a mulher para depois guiar quarenta milhas até ao Surrey onde tem que ir buscar o filho
filha
filhos
filhas que estão com a nanny e depois vai para casa brincar às famílias felizes. Ou se calhar não é a brincar e é mesmo feliz e não é inglês
(pareceu-me italiano, mas depois de o ouvir falar ao telefone, que era algures da Europa de leste.)
Chama-se Haggis
(soava assim, mas não se escreve assim, esta é a minha piada culinária
haggis: miúdos de carneiro enfiados dentro do estômago do bicho cozidos durante duas a três horas e servidos frios; prato tradicional escocês)
e era electricista há um ano, segundo me informou. Ou seja, era impossível ter um cozinhado a arranjar-me o sistema eléctrico, mas podia ter sido um cozinhado a estragar-mo, era isso que ele estava a fazer. A tentar descobrir.
(Duas horas, um encastrado desmontado, dois electrodomésticos arrastados, todas as fichas desligadas, uma cozinha sujíssima depois
descobriu o problema, arranjou o problema e os fios do telefone previamente cortados na noite anterior e foi-se embora a falar na mulher na prole e na nanny.)
Fui para o quintal fumar
(já não fumo de dia nem sozinho, posso até fumar anónimo num café, mas não fumo sozinho)
e pensar que consegui trabalhar antes das quatro e vinte
(altura em que o gajo que é mesmo meu amigo chegou)
e pronto. Agora é agora, ele foi-se embora e eu escrevi.