Encontramos porque não é passado
É na rua que nos encontramos
(que nos encontrámos)
à porta de um colégio que fechava às seis e não quero escrever sobre colégios que fecham cedo mas sobre abraços que não são sentidos
(ou que eu não senti como sentido)
(em que o acordo tónico é tão dissonante
fiquei a tremer.)
não foi o tremer que me incomodou; no último quase ano
(isto porque se passou em Maio
maduro Maio
ou em que já amadurecia e pensava na vida)
por tantas voltas em Nova Iorque. Falei tanto dele porque gostei dele. Numa cidade de tantos milhões como quase um país, no meio de uma escala desconhecida. Não sei, porquê, o gostar nem sempre se explica.
Então foi hoje na rua que nos encontramos
(encontrámos que agora já é passado e não é presente)
que nos encontrámos, chamei-o pelo nome próprio, teve dificuldade em perceber quem eu era tão descontextualizado
(nunca pensei que parta alguém o meu contexto pudesse ser outro do que aquele em que estou no momento presente
não este que não é palpável, mas em todos momentos presentes. Porque nada é estático e o presente muito menos, está sempre autocracizado pelo tempo, não dos relógios mas universal)
depois deu-me o abraço marado e o número de telemóvel e foi de bicicleta. Sempre achei piada às pernas de aranhiço, magras e de calças sempre justas. Fiquei com vontade de lhe telefonar, de me sentar a olhar para o fundo
(lentamente esvaziando e esvaziado
queria escrever estas duas palavras na mesma, sobrepô-las)
de um copo e tentar perceber. Mas há alguma coisa para perceber? Conhecemo-nos e pronto, encontrámo-nos. Não há necessidade de explorar mais o assunto. O desconcerto apenas
(das pernas dele a pedalar e eu a pensar no abraço.)