Memória fragmentária
Sempre me tento ir lembrando de frases
pessoas
detalhes memoráveis de filmes só para mim. E depois não os encontro. Perdem-se confundem-se, como uma gravação em pistas infinitas. Lembrei-me por causa de uma miúda de dezanove anos que anda a foder com um fulano de cinquenta
(Eu nunca gostei dele queria o dinheiro e por isso chupei todas as pichas
caralhos
em São Fernando e todas me souberam bem Mas agora que ele está a morrer que já não há esperança e que a doença se pega aos lençóis às almofadas o cheiro em casa é insuportável E agora que ele está a morrer e agora que eu o não posso ter e que o amo mais do que nunca ele vai morrer e cada dia que passa E imaginar que fiz tudo aquilo e que o desejei morto uma mais do que uma vez e agora quero-o tanto, quero-o vivo, não o quero morto Amo-o tanto
O outro diz qualquer coisa
Cala-te
Cala-te
Cala-te
todas as vezes que for necessário CALA-TE)
.
Seria sempre mais fácil imaginar esta relação como a Lolita. Mas não é. Há-de um dia ser assim. Desde que ela não acabe numa ambulância que capotou
Lo de manhã
Lola à tarde
Lolita à noite
L o
L o l a
L o l i t a
o nome escorregava pela língua dele
(mas não era uma Lolita nem um Humbert)
mas a relação era parecida e acabou assim,
Eu nunca gostei dele queria o dinheiro e por isso chupei todas as pichas
caralhos
em Londres Fulham Chelsea Bosque de São João e todas me souberam bem Mas agora que ele está a morrer que já não há esperança e que a doença se pega aos lençóis às almofadas o cheiro em casa é insuportável E os filhos e ex-mulher parecem abutres a esvoaçar e quero-os longe longe RUA E agora que ele está a morrer e agora que eu o não posso ter e que o amo mais do que nunca ele vai morrer e cada dia que passa E imaginar que fiz tudo aquilo e que o desejei morto uma mais do que uma vez e agora quero-o tanto, quero-o vivo, não o quero morto Amo-o tanto.