Quando o homem quiser
Eu sei que devia escrever. Eu sei que há já alguns dias que devia escrever
(as dores que deviam ser apenas do corpo passam para outro lado e neste momento até quase carregar nas teclas é doloroso não pelo toque mas pela tarefa que há dias devia ter sido completada para dar início a outra)
. Escrever é uma obrigação auto-imposta, um treino intelectual, um aprisionamento de ideias, um roubo ao seu infinito conceptual e finitude quantitativa
(e vai assim)
.
O dia é quando o homem quiser. A mulher não manda
(foi sonegada e silenciada e o agá grande só aparece para que a mulher não fique fora da equação metalinguística porque quando estamos a falar ninguém sabe se é grande ou se é pequeno e a palavra que lá está o campo semântico com que se relaciona é o masculino é uma forma politicamente correcta mas etimologicamente e culturalmente ofensiva. é a forma inicial e acabada da tentativa do homem abafar a mulher e o grande ou pequeno servem apenas para iludir, como um mago com as cartas marcadas. tal como regras gramaticais em que basta haver um homem entre mulheres para se tratar todos no masculino. regras morais e religiosas que cresceram da imposição dos homens sobre as mulheres regras criadas sobre a capa da moral que se transformaram em verdades absolutas e universais. que é senão a justiça que um conceito religiosamente inspirado a igualdade o sofrimento a martirização a abnegação o despojamento tudo aquilo que valorizamos como valores laicos são valores religiosamente derivados que acabámos por tomar como verdades absolutas e princípios de conduta)
nos dias que são nem nos que hão-de vir. O natal é quando o Homem quiser
(ou homem
ou HOMEM
ou hOmem
ou hoMem
ou homEm
ou homeM
e não a mulher)
e o Homem inclui também as mulheres como costela arrancada da metáfora. Mas já das cadelas ninguém diz que os cães têm uma costela a menos.