Os fantasmas e a morte
Quero um dia conversar com um fantasma, algo que surja da idade de um lugar, da força de uma recordação. Dizia olá Dorian,
“Olá Dorian”
e ele respondia olá,
“Olá”
e ficávamos a conversar
(quero conversar com um fantasma e aceitá-lo como algo natural não como um ser que me vem assombrar mas sim como alguém assombrado que regressa porque houve na sua vida terrena algo inacabado. não tem que ser amor ou ódio simplesmente uma vida colhida cedo de mais como a palha na iminência da chuva precoce)
. Tentava não ter medo. Perguntava porque regressaste, porque estás aqui,
“Porque regressaste, porque estás aqui?”
e como quem procura as palavras respondia que morreu sem saber e que precisa de acabar algo para poder morrer totalmente,
“Morri sem saber, tenho precisão de acabar algo que não sei o que é para morrer totalmente”
. Provavelmente não acreditaria que tinha visto o Dorian e acabaria por atribuir a um sonho nunca a uma realidade que se misturava com a imaterialidade. Gostava de conversar com um fantasma com a naturalidade de quem aceita a metafísica como algo natural. Mas céptico, atribuiria os devaneios à líbido.
“Senhorita Saeki, senhorita Saeki, senhorita Saeki”
, chamaria pela senhoria Saeki três vezes para que se virasse. Queria tanto vê-la. Ainda que viva, é um fantasma
(porque regressas ao meu quarto passados tantos anos agora que te vejo velha e te desejo nova)
à noite quando dorme e a alma abandona o corpo.
“Porque me chamas se não é a ti que procuro, se não é a ti quem quero. Há muito desejei alguém que não pôde ser meu. Agora não me chames que mesmo que por ti me apaixone não te posso ter”
, responder-me-ia que não era eu quem procurava, que não era eu quem queria. E mais diria a senhoria Saeki
(eu queria conversar com um fantasma vivo e com um fantasma morto para que pudesse compreender a força que nos move além do corpo. e para ter razões para acreditar no mundo alternativo e metafísico que sempre renunciei por ser pouco sensível mas que sempre desejei ter e compreender)
.