O não saber
Hoje acho que já não sei escrever. Desmonto e monto tantas vezes o método da escrita
(qualquer que seja)
que duvido seriamente dessa capacidade. Num certo ponto da minha achei que sabia escrever
(ou foi-me sugerido e eu acreditei passei a ter a certeza que sabia escrever)
e fazia o que mais natural me parecia. Escrevia em inglês, quase todas as noites, e depois lia em voz alta uma tradução que fazia na hora para os meus pais. Era uma graça mas não era poesia não era nada. Algumas das coisas que escrevia acabavam como letras numa banda em que cantava na altura. Deitava-me de barriga para baixo na cama
e escrevia. Ainda guardo tudo isso numa pasta que se chama arquivo morto.
Escrevia como me lembrava. Depois deixei de escrever em inglês. Escrevia com o que me lembrava na altura
(acreditava seriamente no romântico conceito da inspiração
e no
do qual deriva o
bloqueio do escritor)
e cheguei a construir três livros que não saem mais do arquivo morto. Deixei de escrever porque não sei escrever poesia e acho que nunca saberei
(requer mais esperteza inteligência sabedoria do que escrever prosa tem mais nuances mesmo que muitas vezes seja em verso livre)
. Comecei e acabei um romance que ainda está por acabar. E que tão cedo não estará acabado.
Entretanto tive que escrever academicamente e descobri que não sabia escrever
. Mas eu continuava a achar que sabia escrever. Mas não sabia. Quando não se sabe aprende-se e treina-se. E não somos impermeáveis e as escritas misturam-se.
Não sei o que escrevo quando escrevo.