Juiz
Quando não tenho resoluções de ano novo porque tudo é bem maior do que doze e nunca demoro apenas um segundo a formular e verbalizar mentalmente as complicações que gostava de ver descomplicadas e os desejos que gostava de ver realizados. Mas esperar que uma força mística me socorra sempre sempre foi umas das minhas características dominantes
(embora seja um céptico por natureza)
tal como a objectividade não real. Há algo de flânerie no meu modo de viver, na prodigiosa imaginação que me assiste nas horas mais escuras da minha presença física, das quais necessito ser arrancado e religar à realidade
, atravessando esses momentos imaginando-a de modo alternativo, elevando o chumbo a um metal menos pesado.
Decidi
(em favor da minha coerência mesmo que esta apenas seja revelada pela minha constante incoerência)
que devia evitar ao máximo os juízos de valor. Auto-impor-me um treino que, aplicando-o diariamente
(ainda que este seja passado no espaço assistido pela minha auto-proposta pródiga imaginação)
teria resultados no meu trabalho. Porque não sendo eu bom
(nem sequer razoável)
nas minhas capacidades analíticas, acredito que aquilo que não se obtém com talento obtém-se com trabalho e treino. Esforço.
Saio, portanto, do espaço imaginário
(porque nesse eu sou mesmo muito bom e já sou saltei por cima do processo)
para me encontrar na desconfortável posição da inépcia reconhecível, da ignorância. Quantas vezes não penso sobre a minha ignorância
(tantas quantas com modéstia falseada)
por oposição ao saber. Saber como acto inacabado e continuado no fluxo histórico. Fascina-me e toca nas minhas pulsões o saber. Saber-me gostado por saber
(mas confronto-me com o que não sei angustiando-me que no final o somatório será sempre inferior àquilo que desejaria para mim)
.
Evitar os juízos de valor não me trará mais sabedoria, dar-me-á uma poderosa ferramenta que, espero, me ajudará a saber mais.